Caiaques Nelo – Voando sobre as águas


Considerados os melhores do mundo, são os mais medalhados nas Olimpíadas, de que a Nelo é fornecedora oficial.

75% dos caiaques dos Jogos do Rio são da marca portuguesa Nelo e são construídos em Vila do Conde, Portugal chegando a mais de 100 países.

Quando, em 1978, Manuel Ramos construiu os primeiros caiaques, pouca canoagem se praticava em Portugal. Mais: esta era uma atividade desportiva que só viria a estar regulada um ano depois, através da criação da Federação Portuguesa de Canoagem. A oferta de um produto nacional que respondesse “aos anseios dos clubes portugueses, adequado aos valores que estavam dispostos a pagar”, funcionou como um impulso para a própria modalidade no país. E ninguém mais entendido para o fazer do que Manuel, um dos pioneiros deste desporto em Portugal e que viria a ser o primeiro campeão nacional da modalidade. 38 anos depois, o sucesso destes caiaques portugueses é planetário, olímpico, impressionante.

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Manuel Ramos, mais conhecido por Nelo – que é o nome da sua marca de caiaques –, continua a apontar o que “muitos empresários acham ser um handicap: o fato de Portugal ser um país limítrofe, não estar no centro da canoagem”. Só que essa mesma condição é um motor de crescimento: “Obriga ao esforço em dar passos significativos para se ser o melhor do mundo”. Foi com esse espírito que a Nelo deu o passo da internacionalização, rumo ao Reino Unido: “O país onde a canoagem moderna nasceu, com o mercado mais exigente, que nos obrigava a melhorar o produto e com quem iríamos aprender. Escolhemos o caminho mais difícil, mas mais interessante”, lembra Nuno Ramos, responsável pelas relações públicas. Essa é a estratégia de negócio que o pai, Manuel, implementou desde sempre na MAR Kayaks, a empresa detentora da marca. O resultado está à vista: têm crescido entre 12 a 15% nos últimos anos; faturaram 5 milhões de euros em 2015, exportam 98% da produção para uma centena de países; são líderes mundiais em flat water – maratona e sprint.

O grande indicador da excelência da MAR são os Jogos Olímpicos, ou seja, as medalhas conquistadas por atletas que competem com caiaques Nelo. A primeira medalha olímpica chegou em Atlanta, em 1996. Seguiram-se mais cinco em Sydney, 14 em Atenas – nestes jogos passaram a ser fornecedores oficiais dos Jogos Olímpicos –, 20 em Pequim e 25 em Londres. Para esta edição, “já seria positivo mais uma ou duas medalhas do que em Londres, que foi excecional. Conseguir 80 % das medalhas é uma fasquia muito alta, mais do que isso já é ambicionar demais”, diz Nuno Ramos.

A cada edição dos jogos, a MAR apresenta um novo projeto, um novo barco, “mais estável e veloz; características que fazem com que o atleta possa melhorar a sua performance”. O Nelo do Rio de Janeiro é “radical, apresenta um novo conceito. É um caiaque de proa invertida”, pormenoriza Nuno. E diz Manuel: “Foi sempre o nosso propósito não seguir tendências, mas sim criá-las. Só continuaremos a ser líderes se trouxermos muito de novo à canoagem mundial”.

Proximidade com os atletas

Um dos marcos mais importantes na história da MAR e bem ilustrativo de quanto a empresa prima pela excelência são os Jogos Olímpicos de Sydney, em 2000. Foi aqui que, pela primeira vez, apresentaram “um projeto criado de raiz: um caiaque revolucionário, depois de muitos anos a pensar, em investigação”. “O meu pai conseguiu chegar a um conceito que contornava a regra da largura mínima, exigida pela federação internacional. Colocámos o ponto de largura mais junto do corpo do atleta e adaptámos a parte de cima do barco, de modo a conseguirmos reduzir o volume. O barco fica mais estreito, fica mais perto do corpo. O atleta sente-se mais confortável a remar e, se houver ventos laterais fortes, o barco já não é tão afetado. Foi esse modelo, o Moskito, que nos colocou no mapa. No princípio não foi fácil convencer os atletas, houve muito trabalho, mas depois foi este barco que fez com que a federação internacional abolisse a regra da largura mínima”.

Estes novos conceitos que vão mudando a canoagem mundial são consequência do fomento de uma proximidade com os atletas, quer através do acompanhamento nas grandes competições com a adequada assistência técnica em cada prova, como também de um acompanhamento personalizado através dos centros de treino. Criados há cerca de dez anos, os centros de treino – Aguieira, Cinfães e Algarve, todos em Portugal – recebem cerca de 800 atletas por ano. São oriundos de diversos pontos do mundo, com culturas desportivas diversas, que trabalham assim muito próximos do construtor, resolvendo os problemas com que se vão deparando, ajustando cada vez mais os barcos aos seus próprios corpos. Foi a partir deste trabalho de constante comunicação entre construtor e canoísta que foram criados os caiaques de quatro tamanhos diferenciados. Até aí só havia no mercado dois tamanhos disponíveis – para menos e para mais de 75 quilos. E também há a personalização: “A cara de um filho, a cabeça de um lobo, joaninhas, pin-ups” – a MAR executa qualquer pintura no exterior, mas também no interior do caiaque. Para tudo isto contribui uma equipa de 100 trabalhadores (nove equipas), em que muitos são ou já foram canoístas: “São os próprios que querem vir trabalhar para aqui. Gostam da marca, escolhem-nos. E nós agradecemos termos alguém com sensibilidade para o desporto, que se apercebe dos problemas, que acompanha as provas, que gosta de saber que ganhou o barco em que trabalhou”, diz Nuno, também ele canoísta.

Dinâmica vencedora

A liderar o mercado de provas em flat water, a MAR exige-se ser a melhor em tudo o que faz. Ainda não o é em várias áreas, mas para tal adquire conhecimento e garante que lá chegará. Para continuar a crescer entre 12 a 15% por ano – “fator importante para nos mantermos saudáveis” –, aventurou-se por modalidades como o slalom, o remo, o stand-up paddle e o surfski, de que organiza a já considerada melhor prova do mundo.

“Não somos só uma fábrica de canoas, somos muito mais do que isso. Temos o cuidado de perceber como se organiza uma prova – já fizemos campeonatos do mundo e da Europa – e como se faz um treino. Participamos na estratégia da canoagem mundial e no desenvolvimento da própria canoagem”, afirma Manuel. Exemplo disso é um dos projetos em África, proposto à Federação Internacional de Canoagem, que dá a possibilidade a vários países de construírem os seus próprios barcos: “Levamos o material e o know-how. Construídos os caiaques, aumentarão os praticantes da modalidade”.

O futuro? “É chegar a Tóquio [Jogos Olímpicos de 2020], já estamos a trabalhar para isso; todos os que lá vão competir nasceram já numa ‘era Nelo’. Todos os anos nas taças do mundo, nos campeonatos do mundo, nos Jogos Olímpicos, tenho esse gratificante gozo de poder partilhar as vitórias dos atletas. É isso que nos move, que nos dá a dinâmica vencedora”.

por Ana Serpa