Adotados no Rio, destaques da canoagem Va’a disputam Brasileiro e vaga em Sul-Americano


Baiano Reginaldo Birkbeck e sul-mato-grossense Débora Benevides ganharam novas famílias no Rio e fizeram da Va’a o trampolim para conquistas no esporte e na vida.

Por Globoesporte.com

A segunda etapa do Campeonato Brasileiro de Canoagem Va’a, neste sábado, colocará nas águas da Baía de Guanabara dois personagens que deixaram suas origens e encontraram em novas famílias e em uma modalidade quase amadora uma direção para suas vidas. O baiano Reginaldo Birkbeck e a sul-mato-grossense Débora Benevides são os destaques da competição convencional e dos paratletas que serve de última seletiva para o Sul-Americano de Lima, em novembro. A largada da primeira prova será às 8h, na Marina da Glória, com percursos de 8km e 14km nas categorias V1 (individual), V1R (individual com leme) e V2R (dupla com leme).

Reginaldo era trabalhador rural em Santo Estevão, norte da Bahia. Perdeu a mãe quando era pequeno. A avó passou a cuida-lo, mas também morreu. O garoto não se entendia com o pai e foi morar com o primo. Enquanto isso os dois irmãos se mudaram para o Rio de Janeiro. Ao trabalharem em uma obra na casa da inglesa Victoria Birkbeck, contaram para produtora cultural a história de Reginaldo. Sem filhos, ela se interessou em adotá-lo. Foi sua grande incentivadora. Ele se mudou com 12 anos com a irmã Rosângela, e depois de uma chegada tímida se soltou. Voltou de vez aos estudos no Colégio Minas Gerais, na Urca, onde tomou conhecimento da canoagem.

As remadas se fortaleceram e ele passou a se destacar naVa’a. Depois de diversos títulos nacionais chamou a atenção da canoagem de velocidade. O objetivo era alcançar uma vaga na Olimpíada do Rio, mas ele não se adaptou a tempo. Um baiano na canoagem traz logo a comparação com Isaquias Queiroz, dono de três medalhas na Olimpíada do Rio.

– Isaquias é mais do sul, eu sou do norte da Bahia. E eu conheci o esporte no Rio, em 2009 – diz.

Aos 26 anos, Reginaldo vive com a namorada, faz faculdade de biologia e ainda pinta quadros. A canoagem já o levou para vários lugares do mundo. O esporte lhe dá o sustento como instrutor no clube Rio Va’a, que banca suas viagens – ele também trabalha em uma escola municipal ensinando educação ambiental.

Na primeira etapa do Brasileiro o baiano ficou em terceiro. Diz que não estava bem preparado e neste sábado precisa ficar entre os três primeiros para garantir vaga para o Sul-americano. Já tem prata e bronze na competição. Falta o ouro.

– Não imagino minha vida sem a canoagem. Foi e está sendo o meio de me mostrar para o mundo e conhecer o mundo. E cada dia que passa só vejo o pessoal me requisitando, querendo treinar comigo. Antes da Va’a eu tinha uma vida muito fechada. Assim que entrei no esporte muitas portas se abriram. Foi uma válvula de escape – disse.

Liberdade dentro de uma canoa

Débora Benevides nasceu com uma deficiência artrogripose congênita, e tem as pernas atrofiadas. A mãe morreu aos três anos e o pai biológico a abandonou. Adotada pela ex-mulher do pai, aos 15 anos começou a praticar esporte no lançamento de dardo e arremesso peso do atletismo, em Campo Grande. Um técnico de canoagem apareceu no local onde ela treinava em busca de uma menina para ensinar o esporte. Assim Débora teve contato com a canoa havaiana. Tomou gosto e quando conheceu um dos melhores treinadores de va’a do país, Jorge de Freitas de Souza, quis que ele a treinasse. Para isso ela precisava se mudar para o Rio, onde o treinador mora.

Sem recursos e a autorização dos pais adotivos, ela esperou até os 18, quando reencontrou o Jorge em uma competição, e enfim acertou a mudança para o Rio. Desde então ganhou uma nova família – duas irmãs e novos pais adotivos. Se desenvolveu na Va’a conquistando os títulos brasileiro, sul-americano, e em 2014 o mundial no Rio. Na Lagoa Rodrigo de Freitas conheceu a canoagem de velocidade, entrou para a seleção brasileira e disputou a Paralimpíada do Rio, quando ficou em nono lugar. De olho no Mundial do Tahiti, em junho, voltou as atenções para a Va’a. Mas seu grande objetivo é disputar a Paralimpíada de Tóquio na canoagem de velocidade.

Débora anda de cadeira de rodas. Mas quando está dentro de uma canoa ou um caiaque, se sente como uma pessoa como sem deficiência.

– A canoagem ou qualquer esporte dá uma sensação de liberdade. Da mesma maneira que eu fico dentro do barco, a pessoa que tem dois braços e duas pernas tem a mesma liberdade. É uma sensação única. Você compete de igual para igual – disse.