Atleta da seleção brasileira de canoagem anuncia desligamento da equipe nacional


Gilvan Ribeiro, canoísta de Santa Maria-RS e da seleção brasileira publicou carta de despedida da seleção

Gilvan e Givago Ribeiro, Bronze nos Jogos Pan Americanos de Guadalajara, pré Olímpico para Londres 2012.

Gilvan e Givago Ribeiro, Bronze nos Jogos Pan Americanos de Guadalajara, pré Olímpico para Londres 2012.

Com muita coragem, o atleta anunciou sua despedida da seleção brasileira de canoagem. Explicou não desistir do sonho olímpico, mas sim dificuldade em se adaptar à cidade de São Paulo.

Muita água pode rolar, mas desde já desejamos boa sorte na caminhada do atleta, que ainda acrescentará muito mais do que já acrescentou até hoje na história da canoagem brasileira.

Leia na íntegra a carta aberta publicada pelo atleta Gilvan Ribeiro, em sua página pessoal no Facebook.

Carta de um sonhador

Sou Gilvan Ribeiro, tenho 24 anos, destes, dediquei a metade ao esporte, a canoagem. Sou representante da Seleção Brasileira desde 2005, e por mais de vinte países já carreguei nas mãos o remo, representando o meu país.

Atualmente resido na cidade de Santa Maria – RS, lugar onde ensaiei as primeiras remadas e comecei, em 2001, o alicerce do tão almejado sonho olímpico.
Defendo que ”a grandeza de um homem é medida pela capacidade que ele tem de sonhar”. Dei forma a esta frase no começo deste ano, mas, inconscientemente acredito que sempre vivi estas palavras, pois sempre alimentei – por ingenuidade ou de fato grandeza – sonhos que por vezes pareciam até ser utópicos.

Cheguei a conclusão de que não existo sem um sonho, seja a conquista de uma medalha em um campeonato importante, seja a conquista do diploma como jornalista (que ainda almejo), ou seja o sonho de alcançar o inalcançável horizonte, apenas pela oportunidade de caminhar e aprender algo novo na estrada.

Há cerca de três semanas, na cidade de São Paulo, em uma conversa tranquila – mas nem por isso fácil – expus ao meu treinador o desejo de me afastar da concentração da Seleção Brasileira. Os motivos, muito bem claros em minha cabeça, foram postos a mesa com a intenção de falar toda a verdade do que eu sentia naquele momento, em respeito ao trabalho e a dedicação do meu treinador, que sempre acreditou no meu potencial como atleta e como ser humano.
Pareceu-me tudo entendido, e apesar de ele ter se mostrado chateado, teve a sabedoria de me apoiar na decisão que tomei.

Nestes dias que reorganizo minha vida em Santa Maria, tive a oportunidade de encontrar com alguns amigos, quase todos carregavam um ponto de interrogação no cumprimento, querendo de mim uma resposta que justifique o meu afastamento do time nacional.
Em primeiro momento, peço desculpas a todos aqueles que despertei essa preocupação com minha atitude. Em segundo, justifico o meu até então silêncio, pelo simples fato de precisar de um tempo para digerir a mudança.
Deixo bem claro que não abandonei a seleção, e muito menos o sonho olímpico. O que fiz, foi apenas defender com uma atitude – muito difícil – aquilo que acredito.

Há três anos que a sede da seleção migrou de Caxias do sul para a capital paulista. E há exatos três anos que venho tentando me adaptar a terra da garoa, a selva de pedras, a encantadora e assustadora São Paulo.
Não consegui, tentei e muito, mas não consegui. Forjei um bem estar que eu nunca encontrei por lá. Já morei em muitos lugares, já me acostumei com o afastamento forçado dos amigos, da minha família, mas o que eu ainda não tinha me acostumado e que nunca vou querer acostumar, é com o distanciamento daquilo que sou, que gera por si o meu bem estar.

A culpa não é da cidade, a culpa não é de ninguém, o que tenho em mãos é apenas um fato, e o fato é que eu não consegui me adaptar em São Paulo, ponto.
Minha decisão não foi para abandonar o sonho olímpico, pelo contrário, vim buscar motivação para continuar, pois pelas circunstâncias que me cercava na capital paulista, a chama deste sonho estava se enfraquecendo a cada dia.
Este é o primeiro, mas não o mais importante motivo. Enquanto eu refletia sobre a decisão de voltar, cheguei a conclusão de que eu estava sendo um pouco egoísta ao colocar o sonho olímpico acima de tudo e de todos.

Não acredito em uma felicidade que não possa ser compartilhada, e percebi que tenho muito a fazer aqui em Santa Maria.
O projeto social da Associação santa-mariense de esportes náuticos, que junto a minha família e amigos, foi criado justamente pra isso, compartilhar felicidade e fazer com que ela se multiplique.
Comecei meus passos no esporte em um projeto semelhante ao que criamos, e andei pelo mundo desbravando, conquistando, caindo, aprendendo e crescendo como ser.

Um sonho, que pra mim faz muito sentido hoje, tanto quanto o sonho o olímpico, é poder dar a oportunidade para que esses jovens, que estão cheios de vontade de sonhar, e que só precisam de alguém que os faça acreditar.
Não acho que já fiz muito como atleta (não por falsa modéstia), mas também não acho que fiz pouco (não por regozijo do ego), apenas acho que fiz algo e que posso fazer ainda muito mais, seja dentro ou fora do caiaque.
Escrevo esta carta em respeito a todos que sempre me apoiaram, a minha família, meus amigos, a minha equipe; a todos que torcem pelo meu trabalho e merecem sim, uma resposta.

Digo-lhes com plena convicção, não deixei de sonhar! Apenas mudei de estrada, mas continuo em busca do sonho olímpico e de tantos outros que me fazem sentir vivo.
Se este caminho é o certo só saberei no final da jornada. O que sei agora é que me sinto melhor por aqui, e desejo ter a sabedoria de poder compartilhar alegrias com todos os seres.

Gilvan Ribeiro